15 de fevereiro de 2011

Felicidade

Foto de Rui Calçada, no site http://www.olhares.com/
Esqueceu-se de tudo. Esqueceu-se até de quem era, de como se chamava, de onde morava, do que fazia. Tivesse alguém feito uma dessas perguntas e a resposta seria certamente um olhar de incompreensão acompanhado de uma gargalhada sonora. Seguia pela rua cantarolando, ora correndo, ora dançando como sabia, mas sempre a sorrir, de braços abertos, os olhos brilhantes e os cabelos desalinhados. Gostava de sentir o vento no rosto e as roupas a esvoaçarem. Sentia-se livre, só lhe faltava voar. No seu caminho sem destino cruzou-se com pessoas que lhe falavam, com ar preocupado. Talvez os conhecesse, não sabia. Pareciam-lhe seres de outro mundo, não compreendia as suas palavras, os gestos eram-lhe estranhos. Continuava a rir, acenava-lhes em jeito de despedida, e seguia sem olhar para trás.

Chegou à margem do rio e parou. Ficou imóvel como uma estátua a olhar as águas paradas, as aves, cujo nome esquecera também, a voar em círculos, um ou outro peixe que via passar, os pescadores nos barcos e os outros, na margem, olhando o horizonte enquanto esperavam pacientemente que um peixe mais curioso mordesse o isco. Girou sobre si própria, olhou à volta, queria guardar toda aquela imagem para sempre na memória.

Recomeçou a rir, soltou gargalhadas sem fim, enquanto tirava os sapatos e o vestido leve de Verão com que tinha saído nessa manhã. Os pescadores, alarmados, chamavam-na, gesticulavam, mas ela não os ouvia. Recuou alguns passos, ganhou balanço e correu veloz, mergulhando de cabeça nas águas do rio. Ouviram-se gritos, apareceu gente nem se sabe de onde, correram todos na direcção daquela rapariga louca que se atirara ao rio. Alguém ligou para a polícia e chamou os bombeiros. Ela desaparecera nas águas turvas, para voltar a aparecer na outra margem, de sorriso no rosto. Sentiu-se uma onda de alívio percorrer os espectadores daquela cena quando a viram acenar-lhes, voltar costas e seguir o seu caminho, feliz.

12 comentários:

Lou Alma disse...

=) e fica a apetecer saber o que lhe vai acontecer a seguir!

é por isso que gosto tanto de histórias.

nuvemdoce disse...

Gosto essencialmente de finais felizes...!!..

Beijoka

p.s. ainda bem que não estavas em dia não, tadita da moça, ...oh..um tubaroni(exclamavam os espectadores).. tão novinha...e tão tão..tão......loll...

nuvemdoce disse...
Este comentário foi removido por um gestor do blogue.
nuvemdoce disse...

Ups...a culpa foi do tubaroni...Desculpa dobrei sem querer.., podes apagar!!

Tulipa Negra disse...

Lou Alma, quem sabe o que lhe aconteceu depois? Espero que não tenha apanhado uma pneumonia, com o frio... :D
Beijinhos


Nuvemdoce, teve sorte, realmente. Podia aparecer um tubarão ou ficar presa nas redes dos pescadores ou pior até! :)
Beijinhos

Johnny disse...

A seguir vai saltar de um precipício... com um pára-quedas, claro, porque quem tem esta loucura dentro de si, precisa de a exteriorizar em doses regulares.

Tulipa Negra disse...

Johnny, é bem possível. Ou vai escalar uma montanha, ou fazer bungee jumping... qualquer coisa assim, sem dúvida!
Beijinhos

Briseis disse...

É disto, meus amigos, é disto que se faz aquela loucura que os outros invejam, embora o neguem... A atitude libertadora de mergulhar sem medo!
Muito lindo, Tulipa! Parabéns!

El Matador disse...

Ganda maluca.

Tulipa Negra disse...

B., obrigada. Acho que por vezes as atitudes mais loucas são realmente as mais libertadoras.
Beijinhos


El Matador, esta já não tem cura... :P
Beijinhos

luisa disse...

Ou o rio não é muito largo ou ela tem um grande fôlego... Caramba! Mas ao menos foi um feliz acesso de loucura! :)

Tulipa Negra disse...

Luisa, era um rio relativamente estreito. É que a rapariga é louca mas não é maluca, e não se ia atirar a um rio muito largo. :)